Adelaide Paula
A Literatura é o traje mais sofisticado que alguém pode vestir.
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NO PRIMEIRO MÊS...
O primeiro mês passou e eu passei os dias desfazendo. Desfazendo a memória dos sentidos no corpo. A memória do horário exato, do tempo dividido em terços e quartos. O tempo do relógio tão diverso do tempo biológico. O tempo do relógio impresso nos nervos, nos músculos, na pele. Aquele que toca antes mesmo do relógio digital soar. Passei o mês desmantelando esse mecanismo de controle que diz que a vida só vale se for "utilitária" e você só serve se for para servir. Você servo. Você objeto. Você coisa. Deixei-me fruir. Deixei-me estar. Sem os alarmes alarmantes, gritando, berrando: hora de acordar, hora de levantar, hora de tomar banho, hora de tomar o café, limpar o cachorro, colocar comida e água, juntar as coisas, sair correndo. Respeitar o horário. Lembre-se: é imprescindível respeitar o horário. E o gozado é que quantos não aprenderam a respeitar o horário - de entrar e sair. Exigentes consigo e com os outros também. Nem um minuto a menos, nenhum a mais. Reclamam do atraso, reclamam o minuto além. Corra, corra. Tempo é dinheiro. Mas, o que eles não veem é o tempo perdido dentro do tempo marcado. Entram no horário e saem no tempo exato,mas...desperdiçam o tempo do durante. Figuras opacas, não têm compromisso com o tempo-vida; apenas com o tempo-relógio. Não constroem, não criam, não fazem. A desculpa? Nunca dá tempo. E a culpa é sempre dos outros: a conversa, a bagunça, a fofoca, a agitação lá fora, a alegria de alguém que ri, a música que ressoa por aqui, os passarinhos que piam nas árvores. Ah! É culpa do atrasado que nunca chega e, claro, ele espera ansioso para reclamar, denunciar. Agora... Denúncia sobre ele, ele nunca fez, pois o tempo que ele mata dentro do tempo marcado para ele não vale nada, afinal, ele é o cara que chega e sai no horário. Homicida, já matou muitos sonhos alheios. Torturador, Já torturou muitas vidas com olhares e maldosos comentários. Caluniador, já desqualificou nos outros as qualidades que ele nunca teve. Infeliz, faz-se a todo momento com dia e hora marcada. Exorcizei-o de mim; agora o meu tempo é meu para fazer o que eu quiser na hora exata ou quando me convier. E quando a gente ama o que faz, o tempo passa voando. O tempo passa em paz.    
    
Adelaide Paula
Enviado por Adelaide Paula em 10/07/2017
Alterado em 11/07/2017
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